terça-feira, 6 de novembro de 2012

Vida e Morte Severina


- Tu vê, Ritinha?

- Vejo o quê, Josué?

- O esprito  de painho, que caminha no caminho. 
   Vem de branco, vem vuando, vem sartando, 
   à direita tem um homi 
   e à esquerda uma muié.

- Oxi, Josué! Que bestara é essa agora?
  Tu tá vendo alma penada?
  Crê em Deus pais, eu vô me embora!

- Ó Ritinha! Minha irmã, sinta medo disso não, 
  é Jésuis que tá cum ele. E ele diz pra nós tê fé 
  e a mulé a sua esquerda é Maria de Nazaré.

- Josué, tu me prometi?

- Prometo uque, Ritinha?

- Que esta história de malassombro tu num conta pra mainha.

- Mas por que num deveria? 
  É painho que quer falar!

- Mas se for doidice tua, 
  mainha vai te interná.

- Tu num acredita em mim?

- Acredito Josué!

- Então, mainha, que é fié, haverá de me ter fé.
  Pois foi ela tão guerrera, carrego-me nos seus bucho...
  Foi das mão de vó partera, que, nuzinho, vim ao mundo. 
 Tenho fé que nossa mãe haverá de me acreditá, 
 saber que painho tá vivo e que está a lhe ampará.

- Eu entendo Josué! Porque sou muito devota.
  E por isso eu rezo a Deus, Jesus e Nossa Senhora. 
 Que te ampare no caminho dessa estrada tortuosa. 
 E que nosso bom painho encontre a sua rota, 
Ave, Sinto até uns arrupio de deixá a ispinha torta.

- Már Ritinha, minha irmã!

- O que foi, ó Josué!

- Tenha medo disso não!

- Már se essa alma penada vem a mando do Cão?

- Neste caso minha irmã, 
  ele tá em contradição,
  pois se tá cum Jesus Cristo
  é um Diabo muito bão!

- Josué intão me diga!

- Digo u quê tu quisé?

- Tu pode falar cum eles?

- Posso sim! O que tu qué sabê?

- Pergunte se eles sabi
  se um dia vou casar!

- Painho tá dizendo que dessas coisas 
  num tem tempo pra falá!

- Então, de quê te serve
  falar cum assombração,
  se nem pra tua própia irmã 
  pode achar um moço bão!?

- Painho diz que casamento 
 é coisa daqui da terra, 
 mas que, para os nossos dias,
 isso é coisa muito séria. 
 Diz que tu tá se perdendo 
 correndo atrás de homi, 
 diz que perde tua carne
 quando o esprito é tem fome.

- Que cunversa mais éxtranha agora é essa Josué? 
  Num intendi do que tu disse nenhum pingo de palavra, 
  mas to vendo que essa alma qué me vê é encalhada.

- Ritinha, minha filha!

- Josué, é você?

- Não, pequena, sou seu Pai.

- Sai pra lá Cão dos Inferno, sai de rétro Satanás.

- Ritinha, não seja cega, 
  como os outros desta terra,
  vim de pronto, em teu socorro, 
  em resposta a tua reza. 
 Filha minha, não se queixe, 
 não se zangue, não se entristeça, 
 dê força a Josué,
 pra que ele não enfraqueça. 
 Diga a sua amada mãe, 
 minha esposa de outros dias, 
 que a acompanho deste lado 
 e a espero com alegria.

- Painho, se é tu mesmo, 
  tua filha aqui implora
  me diga de um segredo:
  peço que me dê uma prova!

- Quando eras bem pequena, 
  de tudo tu sentia medo, 
  eu falava em teu ouvido, bem baixinho como segredo: 
  Tu és minha rosa, filha. 
  e você me abraçava e depois me dava um beijo.

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